Por
duas vezes a palavra “idiota” me deixou em maus lençóis. A primeira delas se
deu nas eleições de 2014. Saí do PT, tardiamente – penso hoje ––, em 2010,
depois do escândalo do mensalão. Fiquei abobalhada um bocado de tempo vendo
ruírem-se meus mais caros sonhos.
Não
aguentei mais quando Lula atropelou todo mundo e impôs goela abaixo dos
petistas o nome de Dilma Rousseff para sua sucessora. De quebra – filiada que
sou em Minas Gerais –, eu teria de votar em Hélio Costa para governador. Assim,
se consumaria lá também a união PT mais PMDB que agora aparece em toda a sua
desfaçatez. (Nas últimas delações premiadas Lula diz-se arrependido dessa
indicação. Tarde piaste.) Votei em Marina Silva daquela vez.
Em
2014, no segundo turno, aí a coisa ficou complicada. Ou votava nulo, ou não
comparecia para votar (eu já fizera 70 anos de idade).
Acontece
que, estudiosa que fui da democracia ateniense em seu auge, lembrei-me de
lições de filosofia política e fiz, iradamente, como é meu primeiro impulso, um
voto crítico, por escrito, em Aécio Neves e, por meio de um amigo, arrisquei-me
a torná-lo público por veículo da chamada “grande imprensa”. Santo Deus! No
mesmo dia, do Oiapoque ao Chuí, essa praga chamada “redes sociais” – que eu
desconhecia por completo – divulgou minha foto (tinha até foto minha com mais
ou menos 13 anos de idade) com os seguintes dizeres: “Sandra Starling,
fundadora do PT, afirma que quem vota no PT é idiota”. Burra!
Primeiro,
eu não pensava que ainda pudesse ser lembrada. Afinal, já deixara a vida
pública desde 1998. Pensei que ninguém mais se lembrasse de mim, senão
jornalistas da velha guarda. Em segundo lugar, esqueci-me de que minha frase
escrita mencionava a palavra grega, na acepção que tinha na época da democracia
ateniense, quando o cidadão que deixava de participar politicamente praticava a
“idiotia”. Foi um deus nos acuda. Quase apanhei em casa e na rua. Não fui votar.
Pratiquei a idiotia grega.
Recentemente,
olha eu de novo caindo na peça que a palavra “idiota” sempre me prega! Sabedora
de que alguém havia se referido a mim como “idiota”, pedi que essa pessoa me
devolvesse escritos que eu já tinha publicado ou iria publicar em seu blog. E
fui ao Dicionário Houaiss, já com a nova ortografia, em sua primeira edição,
publicada em 2009. Leio lá, confirmando minha raiva, o verbete: “Idiota –
Diz-se de ou pessoa que carece de inteligência, de discernimento, tolo, ignorante,
estúpido (...)”, e por aí afora, o sentido vulgar e usual do termo.
Alertada,
leio em Gramsci: “Pesemos as palavras. ‘Idiota’: palavra nobilíssima, de origem
grega. Idiota significa, antes de mais nada, soldado simples, soldado que não
tem nenhum galão. Significa, em seguida, quem pensa com a própria cabeça, quem
é peculiar, quem ainda não se submeteu à disciplina social vigente” (p. 55 de
“O Jovem Gramsci”, de Leonardo Japone).
Nos
dias que correm no Brasil, sábio é quem sabe o que é idiota. E idiota é quem
ousa pensar de maneira diferente...
Sandra
Starling foi deputada federal pelo PT-MG.
Domingo,
19 de junho, 2016
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