A Operação Lava Jato provoca
impactos no debate atual da reforma política em pelo menos dois temas:
financiamento de campanha e sistema eleitoral. O que deveria ser modernizado
por necessidade política acaba por representar oportunismo dos envolvidos hoje investigados
pelo Supremo Tribunal Federal (STF). É o que concluem cientistas políticas
ouvidos pelo Estado.
A partir do momento em que
Marcelo Odebrecht assume à Justiça não haver campanha eleitoral no País sem
caixa 2, a tese de financiamento público de campanha da Comissão da Reforma
Política na Câmara ganha ainda mais fôlego do que aquele obtido após a decisão
do Supremo de proibir doações empresariais aos candidatos, em 2015. O colegiado
acredita que R$ 4 bilhões seriam suficientes para financiar partidos e
candidatos a partir de 2018. Para isso, terá de combater a impopularidade da
ideia agravada pelo descrédito dos partidos perante os eleitores.
Outro fator que estimula a
aprovação do fundo público de campanha é o discurso de criminalização do caixa
1 por integrantes da força-tarefa. “Como você vai arrecadar em larga escala se
mesmo a doação legal pode ser tomada como prova de crime? Só que eles
(deputados) estão pegando um sistema altamente inflacionário, de campanhas
anteriores caríssimas, porque estão sendo impedidos de arrecadar pela
jurisprudência”, afirmou Bruno Reis, da Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG).
Para o procurador regional da
Lava Jato Carlos Fernando dos Santos Lima, não cabe à operação apontar
soluções, mas “uma democracia de coalizão baseada em um sistema eleitoral
criminógeno, em uma divisão de cargos que não leva em consideração o mérito,
mas a indicação política, em um controle frágil pela Justiça Eleitoral das
prestações de contas, em um sistema de financiamento ilegal que revela um
capitalismo de compadrio, somente pode chegar aonde chegou”, disse ao Estado.
Reis vê como ingenuidade a
percepção da Lava Jato de que há uma sociedade virtuosa maculada por “forças do
mal”. “Não é isso. Como nossa legislação dá poder ao grande financiador, o
plenário acaba representando antes os interesses desses financiadores. Quando
você faz acordos de leniência com o doador para pegar o deputado, você está
fazendo acordo com Dom Corleone para pegar o gângster da esquina”, disse.
Lista fechada
O professor Leonardo Avritzer,
também da UFMG, acredita que o combate à corrupção não deve ser a “única
preocupação” da reforma política. Ele aponta a força que tem adquirido com os
desdobramentos da Lava Jato, por exemplo, a lista fechada, sistema em que o
eleitor vota no partido. Em tese, esse modelo poderia abrigar políticos com
pendências na Justiça.
“Hoje ela está sendo discutida em
termos de se vai servir para dar foro privilegiado, o que me parece uma
distorção da própria ideia de reforma política”, disse. A Lava Jato não é
favorável à lista aberta hoje em vigor. “Questionamentos como o excesso de
partidos, a onerosidade do sistema eleitoral de listas abertas, entre outros,
foram levantados em diversas palestras e artigos pelos próprios membros da
força-tarefa”, lembrou o procurador.
O relator da comissão, deputado
Vicente Cândido (PT-SP), no entanto, diz que se fosse verdade que a Lava Jato
altera os debates do colegiado, “teríamos 500 votos no plenário hoje, e não
temos”. “Não é a Lava Jato que vai mover o Congresso para fazer a reforma”,
afirmou.
Como não há consenso, como diz
Cândido, em torno das várias propostas da comissão, talvez não seja o momento
de colocá-las em votação, segundo os acadêmicos. “A reforma é necessária, mas
não é conveniente fazê-la agora. Dada a circunstância em jogo relacionada com a
Lava Jato, com vários parlamentares investigados, ministros arrolados nas
denúncias, cria-se uma inconveniência política e moral agora”, destacou Aldo
Fornazieri, professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo.
Se por um lado a Lava Jato
impulsiona a comissão em direção ao dinheiro e blindagem, por outro, mais
otimista, provoca uma revisão do papel dos partidos. “O que temos, por
enquanto, é a aprovação da cláusula de barreira (restrição de atuação
parlamentar e de acesso ao fundo partidário e tempo de TV) pelo Senado, mas a
Câmara dá sinais de ir nessa direção”, disse José Álvaro Moisés, da USP. (AE)
Segunda-feira, 8 de Maio, 2017 as
11hs10
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