Cinco
meses após deixar a magistratura, o ministro Sergio Moro já mostrou que tem
talentos de um político em ascensão. À frente do Ministério da Justiça, uma das
mais poderosas pastas do governo, ele é o responsável pelo projeto mais vistoso
depois da reforma da Previdência. São propostas que ampliam o cerco a corruptos
e corruptores e estabelecem novas regras para o combate ao crime organizado. Em
um país ainda manchado pela tradição de impunidade, a implementação dessas
iniciativas goza de grande aceitação popular. Não é por acaso que o ministro,
apesar dos tropeços iniciais da gestão Bolsonaro, continua muito popular,
segundo as pesquisas. De acordo com o instituto Datafolha, Moro é conhecido por
93% dos brasileiros e aprovado por 59%. É natural que as crises e os problemas
que fatalmente surgirão ao longo do governo mitiguem essa aceitação. Há, porém,
quem aposte no contrário.
Ao
deixar o comando dos processos da Lava-Jato em Curitiba para assumir o
Ministério da Justiça, Moro confidenciou que sua maior ambição era ocupar uma
vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) — a tal que, como disse na semana
passada, corresponde a “ganhar na loteria”. No meio político, cristaliza-se a
certeza de que o ministro tem plano mais ambicioso: suceder a Jair Bolsonaro.
Indagado a respeito, ele desconversa: “Os desafios (atuais) já são
suficientemente grandes para eu ocupar o meu presente. Então, não preciso ficar
me preocupando com o que vou fazer daqui a quatro, oito, doze, vinte anos”,
respondeu.
Pois
o receio do meio político já resultou numa novidade: tramita no Congresso um
projeto de lei que estabelece uma quarentena de cinco anos para juízes ou
membros do Ministério Público que pretendam disputar eleições. Ou seja, se
aprovada, a proposta fulminaria, de imediato, qualquer intenção do ministro da
Justiça de disputar eleições até, no mínimo, novembro de 2023. Autor do
projeto, o deputado Beto Pereira (PSDB-MS) explica que o objetivo é impedir que
a Justiça seja usada para fins políticos. “A gente precisa garantir que as
decisões de magistrados e procuradores sejam isentas, sem contaminação de
política partidária ou ideologia”, diz o tucano.
Por
que cinco anos, e não quatro, por exemplo? “Acho que cinco anos é um prazo
razoável de desintoxicação, já que superaria as eleições municipais do ano que
vem e também as próximas para o Executivo e o Legislativo”, diz o parlamentar.
Na política, os tiros têm alvos bem definidos. O projeto que impediria Moro de
sair candidato atingiria, por tabela, magistrados que se destacam no cenário
jurídico. O juiz Marcelo Bretas, da Lava-Jato do Rio de Janeiro, é apontado
pelos congressistas como um forte postulante a testar a popularidade nas urnas.
Responsável por decretar a prisão preventiva do ex-presidente Michel Temer,
Bretas é ativo em suas redes sociais e já se declarou um simpatizante do
presidente Bolsonaro. Há pouco, publicou uma foto em que aparece ao lado do
governador do Rio, Wilson Witzel, também ex-juiz, no Estádio do Maracanã,
acompanhando a final do Campeonato Carioca.
Diz-se,
à boca miúda, que Bretas pensa em disputar a prefeitura do Rio no próximo ano.
Se essa hipótese se confirmar, ele teria como um de seus adversários o atual
prefeito, o bispo Marcelo Crivella. É esse aparente conflito de interesses que
a quarentena pretende evitar. Crivella é alvo da Lava-Jato do Rio, e há a
possibilidade de seu caso acabar sendo julgado pelo próprio Bretas. Como juiz,
ele pode fulminar um rival político. Para valer na próxima eleição, a
quarentena tem de ser aprovada até outubro deste ano. O prazo é exíguo, mas o
Congresso, quando se interessa pela matéria, consegue ser ágil. O texto
apresentado não fixa a data a partir da qual a regra valeria. Para o
ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral Henrique Neves, em casos assim, o
STF já tem um entendimento. “Mesmo juízes que se exoneraram antes da lei seriam
afetados. Pega todo mundo”, afirma o jurista.
Publicado
em VEJA de 1º de maio de 2019, edição nº 2632
Sexta-feira,
26 de abril, 2019 ás 22:00
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