A
substituição do óleo diesel pelo gás natural liquefeito (GNL) no transporte de
carga reduziria significativamente o custo do combustível e as emissões de
gases de efeito estufa e outros poluentes no Estado de São Paulo. É o que
mostra um estudo conduzido no Centro de Pesquisa para Inovação em Gás (RCGI),
constituído pela FAPESP e pela Shell.
Com
sede na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), o RCGI é um
dos Centros de Pesquisa em Engenharia (CPE) financiados pela FAPESP em parceria
com grandes empresas.
“Os
maiores benefícios, tanto no que diz respeito à redução da poluição quanto do
preço dos combustíveis, são percebidos na capital paulista e em Campinas,
regiões em que o diesel é mais caro do que no resto do Estado e que têm maior
potencial de substituição por GNL. Nossos resultados mostram que, na cidade de
São Paulo, o GNL pode ser até 60% mais barato que o diesel”, disse à assessoria
de comunicação do RCGI Dominique Mouette, professora da Escola de Artes,
Ciências e Humanidades (EACH) da USP e autora principal do estudo.
Mouette
coordena no centro um projeto que estuda a viabilidade de implantar um
“corredor azul” no Estado de São Paulo, conceito surgido na Rússia para
designar rotas nas quais os caminhões usam o gás natural liquefeito em vez de
diesel. Resultados recentes da pesquisa foram publicados na revista Science of
Total Environment.
O
GNL é obtido por meio do resfriamento do gás natural a -163 ºC. O processo de
condensação reduz o volume do combustível em até 600 vezes, tornando possível o
transporte em carretas criogênicas até mesmo para locais distantes de
gasodutos.
Na
pesquisa, foram analisados quatro cenários de substituição do combustível. “No
melhor deles, a adoção do GNL reduziria em até 40% o custo do combustível, 5,2%
as emissões de CO2 equivalente [medida usada para comparar o potencial de
aquecimento de vários gases de efeito estufa]; 88% as de material particulado;
75% as de óxidos de nitrogênio; e eliminaria as emissões de hidrocarbonetos”,
disse Pedro Gerber Machado, pesquisador do Instituto de Energia e Ambiente
(IEE) da USP e coautor do artigo.
“A
metodologia considerou inicialmente dois contextos: um para as regiões
geográficas servidas por gasodutos, denominado cenário restrito (RS); e outro
abrangendo as 16 regiões administrativas do estado, chamado de cenário estadual
(SS). Os dois contextos originaram diferentes versões do corredor azul, com
respectivamente 3,1 mil e 8,9 mil quilômetros de estradas”, explicou Machado.
Segundo
ele, para cada cenário foram consideradas duas formas de distribuição de GNL: a
primeira foi a liquefação centralizada com distribuição rodoviária, que gerou
dois subcenários, um com liquefação centralizada (SSCL) e outro restrito, com
liquefação centralizada (RSCL). E a segunda forma de distribuição seria a
liquefação localmente, na região em que o combustível seria usado, o que
dispensaria a necessidade de distribuição de GNL por rodovias. Dela derivam
dois outros subcenários: o estadual, com liquefação híbrida local e central
(SSHL), e o restrito, com liquefação local (RSLL).
Custos
comparados
“O
cenário denominado RSLL apresenta a menor média de diferença de preço para o
consumidor final entre o GNL e o diesel, o que significa que, neste caso, o
processo de entrega do gás é mais caro por questões de escala e de custo
operacional”, disse Machado.
Já
o cenário RSCL oferece o menor preço de gás para o consumidor final: US$ 12
(RS$ 46) por MMBTU (milhão de unidades térmicas britânicas), ao passo que o
diesel, neste mesmo cenário, custaria US$ 22 (R$ 84,5) por MMBTU. “A diferença
entre o preço do GNL e do diesel nesse cenário também é a maior de todas: US$
10 [R$ 38] por MMBTU”, disse o pesquisador.
Entretanto,
o cenário RSLL foi desenhado no contexto de um corredor com menor extensão e o
investimento seria de US$ 243,4 (R$ 940) por metro. Ao contrário do que
acontece no SSHL, que tem o menor valor de investimento por metro entre os
quatro subcenários (US$ 122,1 ou R$ 470 por metro).
Emissões
evitadas
Segundo
Machado, para o cálculo das emissões dos gases de efeito estufa e dos poluentes
foram levados em conta apenas os dois macrocenários: o estadual (SS) e o
restrito (RS). “Quando se trata do uso de GNL, as emissões de gases de efeito
estufa diferem das de diesel por conta do metano e do óxido nitroso, ambos com
potencial de aquecimento global. Se o combustível usado é o diesel, o dióxido
de carbono é responsável por 99% das emissões de CO2-eq. No entanto, se usado o
GNL, o CO2 representa 82% das emissões de CO2-eq, enquanto o metano é
responsável por 10% e oóxido nitroso, por 8%”, disse.
No
que se refere às emissões de gases de efeito estufa resultantes da logística de
transporte do GNL, o pior cenário foi o SSCL, que corresponde a 1% do total de
CO2-eq emitido com o uso de caminhões. No SSHL, a logística representa 0,34%
das emissões, e no RSCL, a logística corresponde a 0,28% das emissões.
Quanto
aos poluentes, no cenário RS seriam evitadas 119.129 toneladas de emissões de
material particulado, 7,3 milhões de toneladas de óxidos de nitrogênio e
209.230 toneladas de hidrocarbonetos. No cenário SS, os benefícios são ainda
maiores, com redução de 163 mil toneladas de material particulado, 10 milhões
de toneladas de óxidos de nitrogênio e 286 mil toneladas de hidrocarbonetos.
Na
avaliação dos autores, a redução de 5.2% nas emissões de gases de efeito estufa
observada no cenário estadual, quando se compara a combustão de gás natural e a
de diesel, talvez não seja um resultado tão grandioso, mas há reduções
consideráveis dos poluentes locais, como óxidos de nitrogênio (75%), material
particulado (88%) e hidrocarbonetos (100%).
Apesar
das vantagens econômicas e ambientais apresentadas, o GNL ainda enfrenta
barreiras regulatórias para sua utilização generalizada no setor dos
transportes. “Ele não é regulamentado como combustível de veículos no Brasil. A
maioria do GNV [gás natural veicular] usado é gás natural comprimido, o GNC”,
disse Mouette.
O
artigo Costs and emissions assessment of a Blue Corridor in a Brazilian
reality: The use of liquefied natural gas in the transport sector, de Dominique
Mouette, Pedro Gerber Machado, Denis Fraga, Drielli Peyerl, Raquel Rocha
Borges, Thiago Luis Felipe Brito, Lena Ayano Shimomaebara e Edmilson Moutinho
dos Santos, pode ser lido em:
(Agência
FAPESP)
Segunda-feira,
22 de abril, 2019 ás 18:00
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