O
engenheiro Glauco Legatti, funcionário aposentado da Petrobras, procurou a
Operação Lava Jato no início do mês para prestar esclarecimentos de forma
espontânea. Legatti, que teve sua tentativa de delação premiada frustrada,
informou que começou a receber propina da empreiteira Odebrecht em 2001 e, em
uma oportunidade, os valores saíram de uma máquina da contar dinheiro. Entre
2001 e 2014, Glauco Legatti disse acreditar ter recebido US$ 7 milhões da
empreiteira.
A
Odebrecht vive um momento crucial de sua existência. Apontada como a maior
empreiteira do País, busca fechar acordo de delação premiada com a força-tarefa
da Lava Jato. Seu presidente, Marcelo Bahia Odebrecht, está preso desde 19 de
junho de 2015. O juiz Sérgio Moro o condenou a 19 anos de prisão por corrupção
e lavagem de dinheiro.
"O
declarante (Glauco Legatti) e sua defesa desejam consignar que buscaram o
Ministério Público Federal e a Polícia Federal visando a iniciar negociação de
acordo de colaboração, uma vez que o declarante se colocou à disposição para
relatar fatos ilícitos, no âmbito da Operação Lava Jato; que não tendo logrado
celebrar acordo, uma vez que os referidos órgãos não vislumbraram o atendimento
aos pressupostos da Lei, dispôs-se, por meio de petição, a prestar
esclarecimentos de forma espontânea, nos presentes autos, a fim de que seja sua
disposição em colaborar submetida à apreciação do Juízo Federal e do Ministério
Público Federal, para avaliação de possível benefício", afirma o depoimento.
Legatti
declarou que entrou na Petrobras em 1979 e trabalhou na estatal por 36 anos.
Especialista em dutos terrestres, o engenheiro contou que em 1996 assumiu uma
gerência de empreendimentos, então vinculada à diretoria de engenharia e
tornou-se responsável pelas obras do nordeste setentrional até o Amazonas.
"Nesse
período conheceu Rogério Araújo, da Odebrecht; ele possuía obras lá porque na
época trabalhava na Tenege (posteriormente absorvida pela Odebrecht); que por
volta de 2001 ou 2002, o declarante era gerente do empreendimento (no setor de
implementação de empreendimento de transporte dutoviário e ATR) e foi abordado
por Rogério Araújo, acerca de pagamento de vantagens indevidas; que Rogério
aproximou-se do declarante como se já fosse algo "institucional" da
Odebrecht, oferecendo vantagem indevida", relatou o engenheiro.
De
acordo com Glauco Legatti, a amizade que tinha com Rogério Araújo na época
provavelmente facilitou a aproximação. O engenheiro declarou lembrar de muitos
detalhes sobre a primeira conversa com o executivo da Odebrecht.
"Acertaram
então o primeiro pagamento, que ocorreu em uma sala comercial na Rua da
Assembleia, n. 10, andar alto (Centro do Rio), que acredita que fosse um
escritório de doleiro; que Rogério o acompanhou até o local, onde então falou
uma senha a uma secretária (algo como o nome de um réptil ou peixe) e então foi
encaminhado a uma sala, onde havia uma máquina de contar dinheiro; que então
retirou o dinheiro, em espécie", relatou.
O
engenheiro disse que isso ocorreu mais duas ou três vezes, tendo indo ao mesmo
local, dessa vez sozinho. Segundo Glauco Legatti, o executivo da Odebrecht lhe
avisava que o dinheiro estava disponível, dava-lhe um senha, e então ele se
dirigia até lá.
"Isso
ocorreu em 2001 ou 2002; que ganhou cerca de R$ 50 mil a 100 mil por ocasião em
que retirou lá", declarou o engenheiro.
A
PF questionou Glauco Legatti sobre o que o ex-funcionário da Petrobras fez com
o dinheiro. Ele disse que na mesma época procurou uma casa de câmbio na Avenida
Rio Branco, no centro do Rio, para a abertura de conta. Glauco Legatti disse
não lembrar o nome da casa de câmbio e nem da pessoa que procurou.
"O
declarante dirigiu-se ao Credit Suisse e a pessoa referida lhe aguardava para a
abertura da conta; que a conta possuía um número e o nome Moet Chandon",
detalhou.
Glauco
Legatti disse à Federal que posteriormente o doleiro Bernardo Freiburghaus
apareceu em cena, já que trabalhava no banco, e "assumiu" a gerência
da conta?. Freiburghaus, que vive na Suíça, é apontado pela Operação Lava Jato
como operador de propinas da Odebrecht.
No
depoimento, o engenheiro contou que depois de abrir a conta, mandou os dinheiro
recebido de Rogério Araújo e outras economias pessoais para a conta no exterior
?por meio de "doleiro", pessoa vinculada à casa de câmbio. O
engenheiro disse que deu o número da conta no exterior para que Rogério Araújo
efetuasse depósitos lá.
"Não
possui documentos da referida conta; que na conta, possuía cerca de US$ 1
milhão entre vantagens indevidas e economias pessoais", disse.
Abreu
e Lima. Glauco Legatti relatou à PF que em 2007 assumiu o projeto da Refinaria
do Nordeste (RNEST), emblemático empreendimento da Petrobras que sofreu com
superfaturamento e desvios, em Abreu e Lima, Pernambuco. O engenheiro foi
gerente da Refinaria e ocupou o cargo na Abreu e Lima durante seis anos, entre
2008 e 2014 - foi afastado oito meses depois da deflagração da fase ostensiva
da Lava Jato.
"Já
em 2007, quando assumiu o projeto da RNEST (gerente-geral), Rogério (Araújo)
disse ao declarante que seria bom "reativar" sua conta no exterior;
que na época, Bernardo não estava mais no Credit Suisse; que então foi com o
Rogério no escritório do Bernardo; abrir uma conta no Julius Bär, de nome
Kalvaz; que transferiu todo o saldo da Moet Chandon para essa nova conta",
declarou.
"Passou
a receber pagamentos indevidos nessa conta, por meio de Rogério; que os
pagamentos se iniciaram em 2007 e foram até 2011; que nessa conta restaram
cerca de US$ 5 milhões."
Por
orientação de Bernardo Freiburghaus, declarou o engenheiro, abriu uma outra
conta - a Dropjack - em 2011, no Pictet, pela qual também recebeu propina da
Odebrecht. Segundo Legatti, o repasse se estendeu até 2014 e, no mesmo ano, as
contas foram bloqueadas.
"Na
conta Dropjack, havia um saldo final de cerca de US$ 8 milhões", contou.
"O declarante não se importava muito com quanto era depositado pela
Odebrecht, e só era informado periodicamente sobre o saldo das contas por
Bernardo; que os pagamentos cessaram por ocasião do início da Operação Lava
Jato."
A
Federal questionou Glauco Legatti sobre a contrapartida dada por ele à
empreiteira em troca da propina. O engenheiro declarou que disponibilizou um
canal diferenciado para Rogério Araújo no âmbito da RNEST, ainda de talvez de
forma inconsciente.
"Sempre
estava disponível para Rogério, talvez em um grau muito maior do que para
qualquer outra fornecedora da RNEST; que as vantagens indevidas recebidas não
estavam vinculadas a atos específicos e não eram quantificadas a partir de
critérios como "medição", etc, mas que acredita que recebeu para
garantir um bom trânsito da Odebrecht no empreendimento", declarou.
Procurada,
a Odebrecht informou que não vai se manifestar. (AE)
Domingo,
27 de novembro, 2016
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