O
futuro ministro da Justiça Sergio Moro diz que, apesar de o STF já permitir,
ele vai propor que o cumprimento da prisão em segunda instância assuma força de
lei. Sobre as acusações de perseguição política ao ex-presidente petista, o
juiz foi taxativo, nesta entrevista a Germano Oliveira, da revista IstoÉ: “Lula
é o mentor do esquema criminoso na Petrobras. O tríplex é a ponta do iceberg”.
Leia a íntegra da matéria:
O
juiz demonstrava descontração. Nem parecia o magistrado sisudo das audiências
tensas e, não raro, acaloradas com o ex-presidente Lula e os maiores
empreiteiros do País. Chegou a esboçar leves risadas, como a que soltou ao
rememorar ações envolvendo escuta de celulares num presídio, “onde os presos
falavam tanto que os policiais se confundiam até sobre quem falava o que”.
Depois de uma hora e meia com os repórteres da IstoÉ, brincou: “Vocês já têm
histórias para escrever um livro”.
Em
sua primeira entrevista exclusiva para um veículo de comunicação impresso, após
ter sido escolhido ministro da Justiça e Segurança Pública pelo presidente
eleito Jair Bolsonaro, o juiz Sergio Moro ainda utilizou a antiga sala da 13ª Vara
Federal do Paraná, em Curitiba, que ocupa há 15 anos. A partir de agora, deve
passar a concedê-las somente no Palácio de Justiça, em Brasília, suntuoso
prédio onde está instalado o ministério que comandará a partir de janeiro. Sua
mesa na Justiça Federal é o que podemos chamar de bagunça organizada – aquela
em que só o dono é capaz de se encontrar no meio dela, mais ninguém. Repleta de
papeis em desalinho, um em cima do outro, cercada por estantes amontoadas por
livros comprados por ele mesmo.
Mas,
claro, ali no meio daquela aparente anarquia se transpira seriedade. É onde se
batalhava a faina diária de um dos magistrados mais competentes do País,
responsável pela Lava Jato, a mais profunda operação de combate ao crime
organizado desenvolvida no Brasil. Para o novo gabinete, ele ainda não sabe se
levará os livros. Uma hipótese é deixá-los mesmo em Curitiba para não
sobrecarregar a mudança. O mesmo provavelmente fará com sua esposa Rosângela e
os dois filhos adolescentes, só que por outras razões, obviamente. A mulher
cuida de um escritório onde é advogada especialista em casos de pessoas com
doenças raras. Os filhos adolescentes preferem não trocar de escola. “Irei para
casa nos finais de semana”, promete. Quem ele vai levar quase que a tiracolo é
Flávia Blanco, sua chefe de gabinete na Justiça Federal, uma espécie de
faz-tudo do juiz e a quem ele tem em mais alta conta. Moro tem pressa. Terá
pouco mais de um mês para definir também quem levará para Brasília para
integrar a nova equipe. Um de seus desejos era reforçar o time com integrantes
da Lava Jato, mas enxerga “óbices” difíceis de transpor. “Seria um tolo se não
levasse gente da Lava Jato, que já comprovaram competência e dedicação, mas
muitos teriam que abandonar suas carreiras para me seguir”.
Na
verdade, a maior angústia de Moro não é deixar para trás livros, amigos e
colegas de trabalho, mas as dezenas de processos da Lava Jato ainda não
encerrados. Quando desencadeou a operação em 17 de março de 2014, Moro não
imaginava chegar tão longe. Mas, quando decretou a prisão do doleiro Alberto
Youssef, e com ele encontrou o documento da compra de uma Range Rover Evoque em
nome de Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, percebeu
que o caso poderia atingir proporções muito maiores. Preso, Costa revelou em
delação que a Petrobras era usada pelo governo Lula para o pagamento de
propinas a políticos tanto do PT, como do PP e PMDB. Era apenas o fio de um
extenso novelo que alcançaria o maior esquema de corrupção da história recente
do País. A Lava Jato evoluiu de tal maneira que levou o juiz a condenar
importantes dirigentes do PT, o mais importante deles o ex-presidente Lula,
preso em Curitiba desde o começo do ano por ter recebido vantagens da OAS,
entre as quais um tríplex no Guarujá, em troca de polpudos contratos na
Petrobras.
Ao
responder à ISTOÉ sobre o inconformismo do ex-presidente em relação à
condenação imposta a ele, Moro lembrou que a sentença foi “extensamente
fundamentada” e acrescentou: “As provas indicam que Lula é o mentor desse
esquema criminoso que vitimou a Petrobras. E não se trata só de um tríplex. Nós
falamos de um rombo de R$ 6 bilhões. O tríplex é a ponta do iceberg”. Sobre as
acusações de perseguição política, e eventual relação de causa e efeito com a
campanha presidencial deste ano, Moro reavivou que a sentença no caso do
tríplex foi proferida em meados de 2017. “O que existe é um álibi de Lula,
baseado numa fantasia de perseguição política”. Ademais, a decisão de condenar
o petista a nove anos e meio de prisão, reforçou juiz, foi mantida pela Corte
de apelação (TRF-4), que não apenas endossou as suas fundamentações jurídicas
como ampliou a pena para 12 anos e um mês. “A partir daí a decisão não é mais
minha”, disse.
Os
demais processos que Sergio Moro deixará prontos para julgamento, envolvendo o
ex-presidente, como o caso do apartamento São Bernardo do Campo e de um terreno
para o Instituto Lula, doado como propina pela Odebrecht, estarão sob a batuta
da juíza substituta Gabriela Hardt. A sentença deverá ser proferida ainda este
ano. A julgar pela audiência de estreia (leia mais às págs 32 e 33), que lhe
rendeu o apelido de “juíza linha Hard(t)” pela maneira firme como arguiu e
enquadrou o ex-mandatário petista durante depoimento sobre o sítio de Atibaia,
tudo indica que Lula deve ser condenado novamente por corrupção e lavagem de
dinheiro. “Esses processos já fazem parte do meu passado”, esquiva-se Moro.
O
foco do futuro ministro da Justiça agora é na preparação dos projetos de
combate à corrupção e ao crime organizado que serão submetidos ao Congresso já
em fevereiro. Entre as mudanças propostas estão as que possibilitam prever em
lei o cumprimento da prisão após condenação em segunda instância e a redução da
maioridade penal para 16 anos, “mas apenas para crimes de sangue”. Moro
pretende endurecer ainda medidas contra os cabeças do tráfico, não permitindo
as famigeradas saidinhas durante o cumprimento das penas. Uma de suas ideias é
proibir inclusive as tradicionais visitas íntimas a presos. Atendendo a uma promessa
de campanha de Jair Bolsonaro, Moro trabalhará para flexibilizar o porte de
armas, mas apenas dentro de casa: “Não vamos autorizar que as pessoas saiam
armadas nas ruas”. Para quem ainda acha que ele largará a carreira de
magistrado para mergulhar na política, Sergio Moro adverte: “Não serei
candidato a presidente da República. Não tenho nenhuma pretensão de participar
de campanhas eleitorais, nem de subir em palanques”.
(Com IstoÉ)
Domingo,
18 de novembro, 2018 ás 13:00
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