O
Ministério Público (MP) junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) encaminhou
parecer a todos os ministros em que pede a rejeição das contas de 2014 da
presidente Dilma Rousseff. No documento, o procurador Júlio Marcelo de Oliveira
apontou outras "graves irregularidades", além das
"pedaladas" fiscais, e vê uma responsabilidade direta da presidente
da República, o que justificaria a rejeição das contas. O TCU decidirá em
sessão na quarta-feira se aprova ou rejeita as contas de 2014.
O
procurador detalhou o que considera como infração à Lei de Responsabilidade
Fiscal (LRF), por não ter havido o cumprimento de metas fiscais bimestralmente.
"O que se verificou ao longo dos bimestres de 2014 foi exatamente o
contrário do que consagra a gestão fiscal responsável, tanto que o Poder
Executivo propôs a alteração das metas fiscais ao final do exercício",
disse o procurador que atua junto ao TCU.
O
parecer chama de "fraude" um pedido de suplementação orçamentária
feito pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), no valor de R$ 9,2 bilhões,
para custear despesas do seguro-desemprego, bancadas usualmente pelo Fundo de
Amparo ao Trabalhador (FAT). O pedido foi feito em 12 de fevereiro.
"Além
das omissões intencionais na edição de decretos de contingenciamento em
desacordo com o real comportamento das receitas e despesas do país, houve ainda
edição de decretos para abertura de créditos orçamentários sem a prévia,
adequada e necessária autorização legislativa, violando a Lei Orçamentária
Anual, a LRF e a Constituição da República", escreveu Júlio Marcelo no
parecer. "O ato da presidente da República, de fevereiro de 2014, também
desconsiderou o alerta do MTE sobre a previsão de possível frustração de cerca
de R$ 5,3 bilhões na arrecadação das receitas do FAT, considerando as
estimativas constantes na Lei Orçamentária de 2014."
Ao
fim do documento, o procurador cita o episódio da rejeição das contas do
presidente Getúlio Vargas em 1937, a partir do relatório do ministro Francisco
Thompson Flores. "Se, após a implantação do Estado Novo, o corajoso gaúcho
Thompson Flores foi vítima de represália com disponibilidade compulsória
decretada pelo ditador, na era democrática os magistrados de Contas dispõem de
garantias especiais, que constituem as salvaguardas necessárias para exercerem,
com plena independência, coerência, isenção e compromisso com a sociedade
brasileira", finalizou.
POSIÇÃO DO TCU
O
ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Augusto Nardes, relator das
contas de 2014 da presidente Dilma Rousseff, confirmou nesta terça-feira que as
pedaladas fiscais estarão incluídas no parecer a ser julgado amanhã em plenário
e que a manobra aparecerá no relatório como uma "decisão já tomada".
Nardes vem sinalizando a intenção de pedir a rejeição das contas da presidente,
o que precisa ser aprovado pela maioria dos demais ministros. O julgamento
definitivo cabe ao Congresso Nacional.
A
confirmação ainda não significa que ele pedirá a rejeição das contas, mas
garante que as pedaladas estarão no parecer como uma irregularidade, conforme
adiantou o GLOBO na última quarta-feira.— As pedaladas já são uma decisão
tomada e vão estar incluídas no relatório (das contas de 2014 de Dilma). Haverá
no parecer fatos tão importantes quanto as pedaladas, que revelarei na sessão
amanhã — disse o relator, após receber lideranças da oposição em seu gabinete.
Os
senadores Aécio Neves (PSDB-MG), Aloysio Nunes (PSDB-SP), José Agripino
(DEM-RN), Ana Amélia (PP-RS), Eduardo Amorim (PSC-SE) e Ronaldo Caiado (DEM-GO)
se reuniram com Nardes no início da tarde. Depois, os cinco primeiros estiveram
com o presidente do TCU, Aroldo Cedraz. Em caso de empate, diante de uma
divisão dos ministros, cabe ao presidente decidir a votação.
Aécio
disse a Nardes ser "histórico" o que está ocorrendo, pois pela
primeira vez existe um questionamento efetivo às contas de um presidente.
Depois da reunião, o senador disse que o objetivo do encontro foi manifestar
preocupação com a pressão feita pelo governo de Dilma em cima do relator e dos
demais ministros. Na semana passada, o vice-presidente Michel Temer ligou para
Nardes, que recebeu em seu gabinete os ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e da
Advocacia Geral da União (AGU), Luís Inácio Adams.
—
Viemos mostrar preocupação com o assédio do governo. O TCU tomará uma decisão
técnica. Houve crime de responsabilidade por parte da presidente, pois Caixa e
Banco do Brasil faziam esses pagamentos sistemáticos. Alertei isso no debate
eleitoral do ano passado -- disse Aécio.
As
"pedaladas" foram uma manobra fiscal em que o Tesouro Nacional
represou repasses a bancos oficiais como forma de melhorar artificialmente as
contas públicas, em 2013 e em 2014. Diante disso, os bancos precisaram arcar
com os pagamentos de benefícios de programas sociais, como o seguro-desemprego
e o Bolsa Família.
Em
abril, uma votação em plenário no TCU decidiu que a manobra infringiu a Lei de
Responsabilidade Fiscal, por ter se tratado de empréstimo. O governo nega.
Dezessete autoridades da equipe econômica de Dilma naqueles anos foram chamadas
a dar explicações. No julgamento das contas amanhã, a irregularidade fará parte
do parecer a ser apreciado em plenário.
(O
Globo)
Terça-feira,
16 de junho de 2015