Entidades se organizam para participar das eleições e influenciar os presidenciáveis com suas pautas classistas. A capilaridade em todo o território brasileiro ajuda os candidatos a formularem seus planos de governo
O clima de guerra gerado pela gestão de Bolsonaro provocou os movimentos sociais que prometem disputar a narrativa das eleições presidenciais, auxiliando os candidatos na discussão dos problemas brasileiros. Algumas entidades, que não declaram voto por força do estatuto, já organizam suas pautas e propõem soluções para resolver problemas deixados pelo atual governo, que arruinou a economia, atacou o sistema democrático e suas instituições, além de negligenciar a vida de toda a população no período de pandemia.
O envolvimento dos movimentos sociais nas campanhas presidenciais já marcou outras eleições. Alguns presidentes, inclusive, ganharam projeção com o suporte de entidades. Lula até hoje conta com apoio da CUT e da maioria dos sindicatos brasileiros. Fernando Henrique Cardoso surgiu no movimento das Diretas Já, amplamente apoiado por OAB, UNE e CNBB. E Bolsonaro veio na esteira de movimentos anticorrupção como MBL e Vem Pra Rua.
Abandonado pelos movimentos que surgiram com a bandeira de combate à corrupção, Bolsonaro vai se sustentar, provavelmente, nos evangélicos e nos ruralistas. No entanto, o presidente perdeu integralmente a pauta de movimentos contra a corrupção, especialmente após os escândalos da família. Prova disso, é que o MBL fez um ato de filiação para os seus membros que disputarão a eleição nacional, na quarta-feira, 26, ao Podemos para colaborar com a campanha do ex-juiz Sergio Moro. O vereador e dirigente do MBL, Rubinho Nunes, afirmou que “desde 2019 firmamos o compromisso de apoiar o candidato da terceira via e, hoje, o nome mais viável é do ex-juiz Sergio Moro”. A representante do Vem Pra Rua, Luciana Alberto, disse que o grupo também vai apoiar Moro e o que presidenciável já assinou um termo de compromisso, “alinhado com as pautas que o movimento sempre defendeu”.
A crise socioeconômica faz com que o discurso da pauta econômica tome protagonismo nas discussões. Temas como o desemprego, o aumento dos salários, o fim da inflação e a revisão das reformas da Previdência e Trabalhista são os focos dos movimentos sindicais. CUT e Força Sindical apoiarão Lula. Enquanto a CSB apoiará Ciro Gomes. O presidente da Força Sindical, Miguel Torres, diz que a crise atinge principalmente a população mais carente e acredita que o próximo presidente precisará “fazer o País voltar a crescer e gerar empregos”. Antonio Neto, presidente da CSB, reforça a questão trabalhista e afirma que é “preciso unir quem trabalha e quem produz para combater as desigualdades”.
O movimento estudantil também vai participar das discussões das campanhas. Em 2021, 3,5 milhões de estudantes desistiram do ensino superior privado, conforme afirma Bruna Brelaz, presidente da UNE. Ela diz que a entidade está preparando propostas e que pretende ser a maior propulsora do debate sobre a educação. “Nossa geração vive sem perspectivas de emprego, de terminar o ensino médio e de entrar no ensino superior”. Já o movimento de pessoas sem casa própria tem ganhado notoriedade nos grandes centros urbanos. O líder do MTST, Josué Rocha, diz que a entidade apoiará Lula e que pretende discutir “a revisão das reformas feitas a partir do governo Temer e o investimento público na infraestrutura urbana”.
A campanha de reeleição de Bolsonaro não terá vida fácil. O presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, afirma que Bolsonaro precisa ser derrotado nas urnas para que ocorra a reafirmação de um projeto democrático. “Nós vamos passar um bom tempo para nos recuperar desse processo de esvaziamento das instituições e de afronta aos demais poderes”, disse o advogado. O cientista político, Ricardo Ismael, diz que existem componentes nessa eleição que a deixam mais complexa. Setores organizados não têm mais o poder que tiveram nos anos de 1980 e 1990. “Existem atores sociais que não estão representados nesses movimentos, além das mídias sociais”, explica o cientista político. Ele ainda lembra que a atual crise econômica deixou mais da metade das pessoas fora do trabalho formal. No entanto, “essas entidades têm poder de influência, na medida em que têm uma ramificação nacional com dinheiro e unidades espalhadas pelo Brasil”, afirmou.
*IstoÉ
Sábado, 29 de janeiro 2022 às 10:47