Antes mesmo de o
escrete canarinho pisar os abastados gramados inacabados, a máquina
publicitária do governo federal já entrou em campo. Tomou conta de todos os
intervalos comerciais da TV. Com força. Com garra. Com vontade. Com força
total. E também com uma dose considerável do que poderíamos chamar de doideira
oficialista: em pleno país do futebol, onde supostamente a maioria dos nativos
se delicia vendo jogadores dando chutes na bola enquanto um juiz corre atrás
deles com um apito na boca, a propaganda do governo quer convencer o povo de
que Copa do Mundo vale a pena, é legal, é boa à beça. Coisa estranha,
convenhamos. Antes, o governo queria porque queria fazer a Copa no Brasil pois
isso traria a felicidade geral da Nação, sabidamente aficionada desse esporte
exótico. Agora, precisa gastar dinheiro público para encorajar a Nação a ficar
feliz, feliz no geral e no particular, porque a Copa vai ser uma apoteose. Vai
ser, como diz o locutor chapa-branca, "a Copa das Copas".
"Entende?", diria o Pelé.
Aí você
pergunta: Mas o que é que está havendo? Será que existe no governo alguma
desconfiança de que "não vai ter Copa"? Qual a lógica dessa faraônica
operação de marketing? Por acaso o Palácio do Planalto, tão dado a pesquisas de
opinião, andou descobrindo que o brasileiro agora começou a odiar futebol? São
perguntas que merecem alguns minutos da nossa atenção. As autoridades federais
parecem aflitas, o que é esquisito. De um lado, providenciam a força bruta para
atuar como leão de chácara dos estádios. De outro, despejam em cima da
sociedade este interminável e sufocante blá-blá-blá publicitário, pago pelos
cofres públicos.
Quanto à força
bruta, a Presidência da República mandou convocar milhares de soldados do
Exército para vigiar bem de perto os cidadãos que pretendem protestar. Temem
que as polícias, sozinhas, não deem conta da repressão. A própria presidente
Dilma Rousseff já falou que não quer saber de manifestações atrapalhando o
espetáculo. Em Jati, no Ceará, há dois dias, ela declarou que "quem quiser
(se) manifestar não pode atrapalhar a Copa". Com a originalidade retórica
que lhe tem sido peculiar, expressou a sua presidencial opinião: "Acho que
a Copa tem todas as condições de ser um sucesso. Estamos garantindo a
segurança. A conjunção de forças federais com as Polícias Militares dos
Estados, a Força Nacional, tudo isso vai assegurar que ela seja feita
pacificamente".
Do lado do
blá-blá-blá publicitário, o estilo é um pouco menos tecnocrático, embora tente
provar, por meio de cálculos devidamente tecnocráticos, que esta Copa - já
famosa pela gastança de verba pública e pelo desperdício sem critérios em obras
que não ficarão prontas a tempo - tem, digamos, um custo-benefício imbatível.
No fim de tudo, você, brasileiro, pode apostar, vai sair no lucro. Entende?
O Estado de S.Paulo
Quinta-feira, 15 de maio, 2014.
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