A
recomendação do Tribunal de Contas da União para que o Congresso rejeite as
contas do governo e condene as pedaladas e outras gambiarras fiscais da
presidente Dilma Rousseff acende as esperanças de que serão finalmente
cumpridas as regras de parcimônia na utilização do dinheiro público. É a
primeira vez que isso acontece em 80 anos no Brasil. As nações civilizadas há
muito obrigam seus governantes a observarem o equilíbrio das contas públicas, o
que significa não gastar mais do que é arrecadado. A Magna Carta inglesa assim
dispôs em 1215, depois que o Rei Ricardo Coração-de-Leão afundou as finanças do
reino com os gastos na III Cruzada contra os muçulmanos. O sucessor de Ricardo,
e usurpador do trono João Sem Terra, foi o primeiro a ousar desrespeitar a “regra
de ouro” da estabilidade financeira. Deposto, morreu envenenado. Seu corpo jaz
na Catedral de Worcester, com uma advertência no epitáfio sobre o fim dos que
querem fazer sua vontade prevalecer, acima do interesse coletivo. São passados 800 anos do nascimento de um
princípio constitucional tão necessário. É triste constatar, contudo, quão
primitiva ainda é, entre nós, a visão dominante sobre a importância de
assegurar que tais princípios sejam rigorosamente respeitados. Aqui, ninguém deseja o mesmo fim de João Sem
Terra para a presidente Dilma. Mas, passou da hora dos governantes acabarem com
essa atávica complacência com a irresponsabilidade fiscal.
Mais
de dez processos com pareceres contrários do TCU ainda aguardam exame do
Congresso, desde o tempo de Fernando Henrique. “Todo mundo fez errado”, como
observou com generosa compreensão a senadora Gleisi Hoffmann. Então, porque
essa “pegação no pé da Dilma” que, afinal, sacou dinheiro adiantado dos bancos
públicos para evitar que os beneficiários de programas sociais fossem
prejudicados? Irresponsabilidade fiscal continua a ser vista, por muitos, como
uma falta menor. Coisa que só vale para prefeitos de cidades pequenas. Fosse
uma Fiat Elba dada de presente, aí sim se justificaria o impeachment.
A
Lei de Responsabilidade Fiscal completou 14 anos da sua promulgação. É mais uma
“lei que não pegou”. Como a da proibição do jogo do bicho; dos bares colocarem
mesas na calçada; do artigo da Constituição que limita os juros em 12% ao ano;
do agendamento de consultas no SUS; da Lei Seca, etc. São frutos da nossa
frondosa jabuticabeira. Só agora os preceitos orientadores da moralidade na
administração veem à tona. Mais pelo que está custando ao país. O povo sente na
carne. Foram dezenas de bilhões de reais gastos “no cheque especial”, durante a
campanha eleitoral. A presidente autorizou a expansão suplementar dos gastos,
quando a situação já era de contingenciamento dos gastos. Nem a imprensa, muito
menos o eleitorado percebeu em 2014 a real extensão da deterioração do quadro
fiscal. Dilma foi reeleita e agora o
cidadão paga a conta com aumento de impostos. Pior que isto foi a quebra de
confiança do mercado neste governo. Ficou a descoberto o rombo orçamentário de
mais de R$ 30 bilhões. Os desdobramentos resultantes foram dolorosos, como a
desvalorização cambial, a recessão e o desemprego.
Zarcillo
Barbosa
Domingo,
11 de outubro, 2015
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