Mais
telas, mais sobremesas, mais “sim” e o “não” passou a ser usado só para
situações inevitáveis. Para manter a saúde emocional das crianças - e dos
adultos - que estão a cerca de 90 dias em isolamento social, não há apenas uma
resposta certa, mas em comum está a liberdade maior do que nos períodos em que
as crianças podiam circular livremente.
“Eu
abri mão da cobrança em relação a escola, se está disposto faz, se nao quiser,
nao cobro”, diz a médica Lorena Tostes, 44 anos, mãe de duas criança, uma de
sete e outra de quatro anos.
“Eu
abri mão da pressão de dormir cedo e acordar cedo. Deixo elas mais livres.
Também não estou controlando muito tablete. Guloseimas mais liberadas também.
Resumindo: perda de controle total”, conta a médica Daniela Barra, 39 anos, mãe
de duas meninas.
Revisitar
os acordos é uma das atitudes “básicas” para manter o equilíbrio emocional dos
filhos na quarentena, de acordo com a psicóloga Roberta Desnos, coordenadora
pedagógica do Laboratório Inteligência de Vida.
Segundo
Roberta, acreditar que as regras anteriores as pandemias podem continuar sendo
seguidas sem alteração é um forte equívoco. “As rotinas foram alteradas
drasticamente, e por isso de tempos em tempos é preciso rever o que foi
combinado com as crianças e fazer as adaptações necessárias para diminuir os
possíveis conflitos gerados pela intensidade da presença e a restrição de
saídas e deslocamentos. ”
Para
a psicóloga, é importante também ampliar o diálogo e explicar a situação.
“Converse com as crianças de maneira tranquila e honesta e de acordo com a
capacidade de compreensão de cada idade. Não infantilize a criança ou
desconsidere sua percepção da realidade. As crianças estão passando por esse
período de distanciamento social e também tiveram suas vidas alteradas,
portanto também precisam ser consideradas como sujeitos”. Segundo Roberta, o
momento serve para explicar sobre o novo coronavírus, incentivando as crianças
a desenhar o vírus, seus medos, os desejos pós pandemia e, claro, a própria
família.
“Reforçar
que essa situação é passageira que elas não estão sozinhas e podem contar com o
seu cuidado como adulto é muito valioso. O tempo todo as crianças estão fazendo
leituras e tentando compreender o mundo e muitas vezes se sentem responsáveis
ou culpadas ao perceber que algo está errado. Converse com seu filho e filha
sobre o que está acontecendo e sempre pergunte suas opiniões e versões sobre o
que ele ou ela acha que tudo isso significa”.
A
rotina mudou, mas ainda é importante manter uma organização para lidar melhor
com o distanciamento social. A psicóloga incentiva a planejar o dia e as
atividades, para que as crianças tenham um ambiente seguro que favoreça a
diminuição de sintomas como estresse e ansiedade.
“Estabelecer
horários para dormir, acordar, fazer as refeições, assim como as atividades
escolares e de lazer, pode promover maior bem estar em todos os membros a
família. Não é preciso ser algo extremamente rígido, mas estabelecido de modo a
favorecer a dinâmica da casa”, destaca.
A
chefe de gabinete parlamentar Patrícia Paraguassu, 37 anos, mãe de uma menina
de 7 anos, viu, na prática, que liberar demais só deixou as coisas mais
complicadas. “Ela antes gostava mais das aulas, tinha mais paciência. Agora
está desinteressada. Eu liberei de assistir algumas aulas, achei que poderia
ficar cansativo e, acabei liberando. Daí agora ela corre pra TV e, se deixar,
não sai mais. Percebi que não adianta ceder tanto. As vezes eu acho que a rotina
tem que ser mantida de alguma maneira”, conta.
Segundo
a psicóloga, é preciso preservar tanto a brincadeiras e jogos estruturados e
direcionados, como momentos de livre brincar. Na casa da médica Roberta
Catarfina, 37 anos, a brincadeira aumentou. “Tempo de tela aumentou e nós
compramos um vídeo game, compramos uma segunda cachorra, começou aula de
guitarra, anda de skate todos os dias, assiste aula apenas duas ou três vezes
na semana e faz 50% das tarefas ou menos”, conta.
Na
casa de Magali Dantas, 51, a servidora pública também investiu nas
brincadeiras. “Além das sobremesas todos os dias e noites, teve chuteiras,
patinete, bike. Já teve três natais aqui”, diz.
“As crianças precisam se movimentar e por
conta da diminuição considerável das atividades físicas, não podemos negligenciar
o corpo nesse momento tão atípico. Se possível, faça jogos e circuitos para que
as crianças pulem, dancem, corram e etc. Investir em atividades artísticas como
pintura, desenho, contação de histórias é fundamental para as crianças darem
vazão ao que estão sentindo também”, destaca a psicopedagoga.
Confira
dicas do Laboratório Inteligência de Vida para manter o equilíbrio das crianças
no isolamento:
Descanso:
Crie hiatos entre as atividades, para não fazer nada por um breve instante.
Lidar com o tédio é um aprendizado importante no autoconhecimento, gestão das
emoções e o desenvolvimento do potencial criativo.
Autonomia:
estimule atividades e depois deixe a criança brincar sozinha. Identifique junto
com ela quais são as ações que são possíveis serem realizadas sem a ajuda de um
adulto (se vestir, escovar os dentes).
Tarefas
domésticas: Inclua as crianças na realização das atividades. Além de ajudar a
desenvolver a autonomia, isso aumentará o senso de responsabilidade e favorece
a manutenção dos vínculos familiares.
Uso
de telas: Nesse momento flexibilizar o
uso das telas é algo necessário, mas é preciso estar atento ao tempo adequado
de acordo com a idade da criança e evitar uso sobretudo nas horas que antecedem
o sono.
Sono:
assegurando sonecas ao longo do dia (se forem bebês ou crianças pequenas),
estabeleça rituais de sono pouca luminosidade, aparelhos eletrônicos fora do
ambiente ou desligados.
Rede
social: Estimule que a criança mantenha algum tipo de contato com as crianças e
adultos que faziam parte da sua vida antes da pandemia.
Humanize-se:
Mostrar que você também fica preocupado em alguns momentos, que sente saudade
das pessoas que não pode ver e que experiência tristeza e alegria, assim como
ela, fará com que ela não se sinta só e entenda que as oscilações são naturais
nesse momento. (ABr)
Domingo,
21 de junho, 2020 ás 12:00