Avança pelos corredores do
Planalto e toma conta da Esplanada dos Ministérios e da base aliada a sensação
de um fracasso histórico e de uma derrota fragorosa do mandatário nas eleições
que estão por vir.
Ele mesmo já teria se dado
conta disso. As pesquisas, até as internas que seus auxiliares encomendam, não
deixam dúvidas. Ao menos 64% das pessoas disseram que não votam nele de jeito
algum, estatística difícil de reverter nesses termos – faça o que fizer e
apesar de contar com a máquina na mão e toda a sorte de ferramentas do Estado
para atrair eleitores. Mais da metade, 51%, acham seu governo ruim ou péssimo.
Bolsonaro se esvai no desespero e parte para o
tudo ou nada, ensandecido. No afã de se mostrar popular, surge,
deprimentemente, numa cena grotesca, devorando um frango assado com as mãos,
debaixo de uma tenda armada, espalhando farofa para todo o lado como um animal
esfomeado. É um espetáculo montado, filmado e dirigido para transmitir a ideia
do homem simples, algo que não é. Filho e ministro coordenam, calculadamente,
os movimentos. O teatro provoca efeito contrário.
Em um País onde mais de 20
milhões de brasileiros não possuem absolutamente nada para comer e mais de 50
milhões sofrem de alguma carência alimentar, ele encena a fartura, saciado,
empanturrado, sem modos ou cerimônia. O mesmo presidente pilhado em passeios de
jet ski ou lanchas em resort, dançando funk, com gastos astronômicos no cartão
corporativo – batendo um recorde sem precedentes entre os pares, nesse sentido
–, com mais de R$ 30 milhões de despesas em três anos de gestão ou quase R$ 1
milhão ao mês não é exatamente um pé rapado.
Para o assalariado, que sofridamente corre
atrás de saídas, todos os dias, para quitar as contas, a ideia de alguém com a
esplêndida mordomia que o cerca (carros, palácios, seguranças e gordos
rendimentos), sem ter de abrir a carteira para nada, gastar essa baba de
dinheiro, sabe-se lá em quê, é desaforo. Assim, a pantomima da farofada
protagonizada pelo titular do poder central não convence. Nem os seguidores
aprovam. O vídeo é rapidamente tirado do ar. Não adiantava mais.
O estrago promovido por cada
uma das aparições do capitão tem sido enorme. Ato contínuo ao frango com
farofa, ele resolveu sobrevoar áreas atingidas pelas chuvas e desabamentos em
municípios ribeirinhos de São Paulo, que enfrentam uma catástrofe tenebrosa,
inclusive com perdas de vidas. Quase três dezenas de pessoas até aqui foram
levadas pelas enxurradas.
O presidente, em um impulso descabido e de
notório preconceito, resolveu culpar as próprias vítimas. Disse que faltou a
elas visão de futuro. Difícil acreditar que o chefe da Nação foi capaz de uma
barbaridade dessas. Ele é quem parece não ter visão alguma, nem do presente,
nem do impacto que declaração tão desmiolada provoca de revolta.
A percepção de um presidente insensível,
psicopata e desprovido de moral prevalece. As agremiações que até aqui lhe
davam guarida vão aos poucos desembarcando. A debandada de apoio é notória e
acelerada.
Mesmo de venais parceiros até
aqui fiéis. O Centrão, por exemplo, já pouco acredita na recondução do Messias
e pensa em mudar de lado. Justamente rumo ao extremo oposto onde está lotada a
candidatura do demiurgo de Garanhuns. Para esse bloco, não interessam
colorações ideológicas, plataforma programáticas, valores democráticos.
Não é disso que se trata e sim da permanência
garantida nas tetas do Estado, ao lado do vencedor da vez. E Bolsonaro fornece
indicações de não reunir hoje a menor condição nesse sentido. Ele perde
literalmente de TODOS os adversários em segundo turno, demonstrando a quanto
arredia está a parcela majoritária do eleitor a sua figura. Bolsonaro é o diabo
a ser excomungado de Brasília, pensa a maioria, após os atos tresloucados em
que atuou contra a vacina ou a favor de golpes.
Ninguém quer mais um lunático no comando,
capaz de digressões à Lei e à ordem, com uma natureza fascista e corrompida por
esquemas de favorecimento a filhos, amigos e apaniguados de última hora. Os
urubus da boquinha estão correndo atrás de outra carniça e muitos acreditam que
se Bolsonaro não desistir da corrida ou, eventualmente, alcançar o segundo
turno, Lula estará eleito. Por mais contraditório que possa parecer, ele
empurra o adversário direto para o seu lugar.
Nesse quadrante da campanha e
diante dos fatos, o mandatário parece disposto a radicalizar, esquentando a
turba dos fanáticos que tradicionalmente o acompanham. Resolveu peitar
novamente o Supremo Tribunal, mirando, como de hábito, o desafeto de plantão,
ministro Alexandre de Moraes. Contrariou ordens de prestar testemunho à Polícia
Federal sobre uma acusação de vazamento de informações, e ficou por isso mesmo.
Outro magistrado, o presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, diz que faltam
adjetivos para qualificar atitudes de Bolsonaro que “auxiliam milícias digitais
e hackers”. No inferno astral que enfrenta, desprezo, farofa e visão de futuro
distorcida são combustível explosivo contra suas ambições. A retirada das
tropas de suas hostes – e o Partido Republicanos foi um dos primeiros a
anunciar formalmente a possibilidade – é apenas o prelúdio do naufrágio
iminente. E ele será dantesco.
*IstoÉ
Sábado, 05 de fevereiro 2022 às
11:34