A defesa de Fabrício Queiroz, amigo do
presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e ex-assessor do senador Flávio
Bolsonaro (Republicanos-RJ), foi informada em agosto do ano passado sobre a
existência de um inquérito sigiloso da Polícia Federal no Rio de Janeiro que
mencionava o policial militar aposentado.
O
presidente, naquele mesmo mês, decidiu demitir o então chefe da
superintendência da corporação no Rio e chegou a tentar emplacar um nome de sua
escolha, o que não conseguiu.
Nessa
investigação sigilosa, Flávio e Queiroz são citados em relatório federal do
Coaf, órgão de inteligência financeira, sobre movimentações suspeitas. Nenhum
dos dois, contudo, é alvo da investigação.
As
circunstâncias do acesso a esse caso são semelhantes àquelas narradas à Folha
pelo empresário Paulo Marinho, suplente de Flávio no Senado e seu atual
adversário político.
Segundo
Marinho, em outubro de 2018, um delegado da PF avisou assessores de Flávio que
documento em posse da Operação Furna da Onça, à época ainda na fase de
investigação sigilosa, havia detectado suspeitas sobre Queiroz. Nenhum dos dois
era alvo da apuração.
Esse
novo caso ocorreu em agosto do ano passado, mês em que iniciou a crise entre
Bolsonaro e a Polícia Federal em torno da superintendência da corporação no Rio
de Janeiro.
Trata-se
de uma investigação aberta com base num dos já conhecidos relatórios do Coaf,
produzido em julho de 2018, que tem dez personagens principais —entre eles
Queiroz e Flávio.
O
inquérito em questão, instaurado na PF em fevereiro de 2019 pelo delegado Acen
Amaral Vatef, a pedido do Ministério Público Federal, apurava especificamente
crimes de evasão de divisa praticados, em tese, por um advogado do Rio Grande
do Sul, também citado no relatório do Coaf.
No
curso dessa investigação, em 29 de agosto do ano passado, o então advogado de
Queiroz, Paulo Klein, solicitou acesso ao inquérito, apontando a menção ao seu
cliente nos autos. A juíza Adriana Cruz negou o pedido, afirmando que o PM
aposentando não era investigado nos autos, mas concedeu cópia do relatório que
o menciona.
Naquele
momento, não havia ocorrido nenhuma oitiva formal de testemunhas ou
investigados, apenas algumas diligências, como envio de ofícios a órgãos públicos
e também um pedido de informação para uma empresa que teria recebido dinheiro
do alvo do Rio Grande do Sul.
Até
ali, o inquérito tinha passado, além da PF, pelo Ministério Público Federal e
pela Justiça Federal. Em maio, três meses antes, dois advogados de investigados
pediram e tiveram acesso aos autos.
O
pedido à juíza, contudo, mostra que a defesa de Queiroz teve conhecimento sobre
a menção ao PM aposentado em inquérito sob sigilo que não se referia a ele. A
dinâmica é semelhante à ocorrida supostamente na Operação Furna da Onça, como
contou Paulo Marinho à Folha.
O
empresário afirmou que Flávio foi informado por um delegado da PF sobre a
existência do relatório mencionando Queiroz no âmbito de um inquérito que
investigava dez deputados estaduais. O senador e o PM aposentado não eram alvos
da apuração da PF naquele momento.
Queiroz
foi o pivô da investigação contra o senador aberta pelo Ministério Público do
Rio de Janeiro em julho de 2018 e que levou à quebra de sigilos bancário e
fiscal deles.
No
caso de agora, o documento do Coaf que está no inquérito também integra o
procedimento criminal do Ministério Público do Rio de Janeiro. Tanto Flávio
como Queiroz já tinham, portanto, cópia dele quando a defesa do ex-assessor
parlamentar solicitou acesso a esse inquérito da PF.
Em
relação ao senador, o documento de julho de 2018 do órgão aponta que suas
contas tiveram uma movimentação acima de sua capacidade financeira entre agosto
de 2017 e janeiro de 2018. A conta de Flávio Bolsonaro recebeu no período R$
337,5 mil e pagou R$ 294,7 mil.
Boa
parte dos depósitos se referem ao salário da Assembleia e a transferências
feitas pela conta da loja de chocolates da qual é sócio.
No
relatório, o Coaf afirma que a renda do senador não amparava, na ocasião, a
movimentação. O órgão federal, contudo, considerou apenas o salário dele como
deputado estadual, sem levar em conta eventuais dividendos de sua empresa.
O
pedido do advogado de Queiroz à Justiça foi feito em 29 de agosto do ano
passado. Duas semanas antes, no dia 15, Bolsonaro atropelou o comando da PF e
afirmou que iria trocar o superintendente do Rio de Janeiro, à época Ricardo
Saadi.
A
fala foi o estopim da crise na corporação que culminou, em abril deste ano, na
saída de Sergio Moro do Ministério da Justiça. O ex-ministro afirma que
Bolsonaro insistia em ter alguém de sua confiança comandando a PF no Rio de
Janeiro.
A
PF ouviu nesta quarta-feira (20) o empresário Paulo Marinho sobre o suposto
vazamento do relatório do Coaf a Flávio Bolsonaro. A coluna Painel revelou na
terça (19) que um levantamento informal feito por integrantes da corporação
chegou a três suspeitos pelo vazamento.
O
advogado Paulo Klein afirmou que não comentaria o caso por não atuar mais na
defesa de Queiroz. A Folha não conseguiu localizar o ex-assessor de Flávio. A
PF disse que não comenta investigações.
*Folha
Quinta-feira,
21 de maio, 2020 ás 08:30