No Brasil, acompanhar o noticiário político é como ir ao teatro. Tudo encenado, diz uma coisa, mas faz-se outra, o roteiro é sempre surrealista, cheio de imprevistos e frases de efeito. É impressionante o número de notícias-crime ou notícias de fato, que motivam espalhafatosos inquéritos, mas as investigações dificilmente levam à abertura de processos e mais raramente ainda redundam em condenação, quando se trata de políticos e outros criminosos de elite.
E tudo isso significa altos custos, para que se mexam os integrantes do Judiciário, do Ministério Público e da Polícia Federal ou dos Estados. Sempre custa muito caro levar adiante os inquéritos, mesmo que estejam apenas fingindo que investigam.
Assim, depois que os três apodrecidos Poderes se uniram naquele “pacto de governabilidade” inventado pelo ministro Dias Toffoli logo no início do governo Bolsonaro, as cortinas se abriram e começou a ser apresentada a maior superprodução dos últimos tempos – a destruição da Lava Jato, o mais efetivo esquema de combate à corrupção já promovido no mundo.
Três anos depois, o resultado do pacto de governabilidade é impressionante. A Lava Jato foi sepultada sem choro nem vela, como diria Noel Rosa, e houve tamanha rocambolesca narrativa, e de tal maneira, que até surgiu um novo substantivo de significado altamente depreciativo – “lavajatismo”, para designar perseguição jurídica a pessoas inocentes…
Esse pacto pela impunidade lavou, enxaguou e secou a memória nacional, hoje poucos se arriscam a defender a Lava Jato, e os criminosos levados à cadeia estão todos soltos – à exceção do extravagante Sérgio Cabral, que jogou na lama o nome que recebera do pai, sem falar no filho nem no espírito santo.
Um pacto dessa ordem, celebrado pelos três Poderes, é claro que traria sequelas, e a maior vítima foi Jair Bolsonaro, que se elegera combatendo a corrupção. Ele não percebeu que se tornaria refém do Supremo e do Congresso, não teria mais o papel principal e só poderia disputar o Oscar de Coadjuvante.
Bolsonaro contava com a reeleição, jamais imaginou que Lula recuperasse os direitos políticos. Quando isso aconteceu, nem reagiu, ficou inerte. Poderia ter acionado a Procuradoria-Geral da República para obrigar o Supremo a rever o julgamento, totalmente inconstitucional, pois teve base em “incompetência territorial absoluta”, algo que Padre Quevedo diria que “non ecziste” no Direito brasileiro ou de qualquer país.
Aqui como lá, a “incompetência territorial” só anula condenação quando se trata de processos imobiliários, e o caso de Lula era de ação criminal. O procurador-geral Aras é a única autoridade que pode pedir anulação do julgamento do Supremo, mas não foi acionado por Bolsonaro e ficou quieto no seu canto.
*Tribuna da internet
Domingo, 09 de janeiro 2022 às 15:47
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