Há
problemas no Brasil que atravessam os séculos. O patrimonialismo na
administração pública é uma chaga que teima em resistir à modernidade. Alguns
governantes pensam e agem, ainda nos dias de hoje, como se donos fossem da
coisa pública, administrando os negócios do Estado a partir de critérios que
apenas atendem e servem aos seus interesses particulares.
Esses
dirigentes caminham à margem da lei, quando não acima dela. Governam com os
parentes, amigos e correligionários, confundindo o público com o privado, como
se ainda vivêssemos nos tempos dos estados absolutistas.
Se
você é empreendedor e contrata com o governo – seja ele municipal, estadual ou
federal – logo perceberá o desafio.
As
dificuldades começam nos procedimentos licitatórios e se agravam na hora de
receber pelos serviços prestados. As empresas participam de processos de
seleção extremamente burocráticos – por vezes pouco corretos – investem em
equipamentos, contratam pessoal, recolhem tributos, prestam corretamente o
serviço contratado e na hora de serem remuneradas enfrentam, muitas vezes, o
atraso no pagamento ou mesmo, pura e simplesmente, o calote.
Como
cidadão, se você não paga seus impostos ou deixa de honrar seus compromissos
financeiros, o protesto, a execução, o Serasa e a penhora de seus bens lhe
aguardam inexoravelmente. Os governos, ao contrário, deixam de pagar seus
fornecedores sem que quaisquer sanções recaiam sobre os administradores
públicos.
Faltam
recursos, justificam. Problemas orçamentários, sustentam. Queda na arrecadação,
alegam. Mas nada disso impede que os amigos, as empresas colaboradoras das
campanhas eleitorais e os apadrinhados políticos recebam em dia, enquanto os
outros prestadores de serviço são obrigados a suportar o prejuízo e o
constrangimento das peregrinações intermináveis aos gabinetes oficiais.
Muitas
prefeituras municipais e governos estaduais não pagam suas obrigações nem
quando condenadas pela Justiça, o que gera uma indústria de precatórios não
cumpridos, elegendo-se o “calote” como regra gerencial e como técnica
administrativa.
O
calote e o apadrinhamento são os principais responsáveis pelos elevados custos
das contratações públicas e são portas escancaradas à corrupção e ao peculato.
Precisamos
de leis contra essa situação, exclamam alguns. Na verdade, precisamos mais do
que isso, pois não faltam normas e regulamentos, embora sua eficácia seja quase
nula.
A
Lei das licitações públicas, por exemplo, determina que o pagamento aos
fornecedores obedeça à ordem cronológica dos empenhos liquidados, para se evitar
que, em tese, os pagamentos feitos pelo gestor fiquem ao sabor das decisões
subjetivas, políticas ou pessoais, o que pode dar margem à improbidade
administrativa e à corrupção.
Porém
– e há sempre poréns e todavias – os governantes descumprem cotidianamente a
lei sem que sofram a punição devida. E violar essa regra é crime, conforme
dispõe o art. 92 da Lei 8.666/93. Pagar fatura com preterição da ordem
cronológica de sua exigibilidade dá detenção de dois a quatro anos, mais multa.
Ou melhor, deveria dar.
São
raros – se é que os há – os casos de punição por desrespeito à ordem
cronológica dos pagamentos ou pelo calote definitivo no credor, fato que
representa, sem dúvida, um verdadeiro enriquecimento ilícito por parte dos
governos.
O
Ministério Público e o Judiciário devem atuar com mais rigor no sentido de
fazer cumprir a lei, responsabilizando penal e civilmente os governantes que
fazem seu o que a todos pertence.
É
preciso que os Tribunais de Contas passem a rejeitar as prestações de contas
dos que atrasam e descumprem a ordem cronológica dos pagamentos, ou
simplesmente não pagam suas obrigações, não mais aceitando as justificativas
frágeis e insustentáveis dos administradores que, na verdade, apenas escondem o
favorecimento e a corrupção.
O
exemplo deve vir de cima.
Muitos
anos atrás, dizia-se que ou o Brasil acabava com a saúva ou a saúva acabava com
o Brasil. Com a saúva conseguimos acabar, precisamos agora, urgentemente,
dizimar as sementes da corrupção.
Roberto C Marinho é servidor
público federal aposentado e pequeno empresário, gerador de empregos e
impostos.
Quarta-feira,
03 de fevereiro, 2016
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