Liberdade de expressão

“É fácil submeter povos livres: basta retirar – lhes o direito de expressão”. Marechal Manoel Luís Osório, Marquês do Erval -15 de abril de 1866

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07 janeiro, 2023

DEPOIS DA REVOLUÇÃO SEXUAL E CULTURAL, A HUMANIDADE ESTÁ NUM SINISTRO RETROCESSO

 

“Qualquer coisa virou um problema”, me disse um colega professor, incomodado com a recomendação de que ele e seus colegas não dessem mais aulas de pé, de modo a não ficarem com os respectivos membros penianos à altura do rosto dos alunos, o que seria “ofensivo”. Não acreditei, mesmo ele jurando ser verdade.

 

Depois de algum tempo, deparei com uma colunista reclamando de Jennifer Lopez por sua beleza “fora da realidade”, para uma mulher de 53 anos. Seria um “desserviço” às “mulheres comuns”. Fiquei imaginando J.Lo caprichando para sair mal nas fotos, só para não despertar a ira de algum lacrador.

 

Comecei a achar que meu colega tem razão. E que há cada vez mais gente topando se submeter aos vigilantes da vida, da beleza ou do sucesso, para não se incomodar. Espero que a J.Lo não faça isso.

 

Há, porém, um segundo degrau, onde atuam nossos problematizadores. A Copa foi o seu paraíso. Li que as dancinhas dos jogadores brasileiros eram um “desrespeito”; que o gesto fálico do goleiro da Argentina, com a taça, era o final perfeito para aquele “torneio testosterônico”.

 

E o Padre Lancellotti dizendo que era uma “vergonha” aquele jantar dos jogadores com direito a um pozinho dourado temperando a carne. “Na minha folga, faço o que bem entender”, disse o Vini Jr. Ele tem razão, mas há uma multidão de gente furiosa que não pensa assim. Gente inclusive com poder de influenciar instituições.

 

E aí entra um terceiro degrau da problematização atual, quando as empresas e organizações, e o próprio Estado, padronizam a vida das pessoas. Um dos casos mais interessantes que li, por estes dias, foi o índex das “palavras nocivas”, da Universidade Stanford, banindo de suas páginas expressões vistas como ofensivas.

 

Não pode mais dizer “imigrante”, assim como, pasmem, usar a palavra “americanos”, pois poderia ofender alguém que não é americano, mas vive na América. Depois de nossa longa revolução iluminista, ensaiamos recriar os index prohibitorum em nossas universidades. O limite disso? Ninguém sabe.

 

Há alguns traços comuns em todo esse dramalhão coletivo. O primeiro é o moralismo. Uma espécie de neopuritanismo tardio, que surpreendentemente toma conta da nossa cultura.

 

Depois da revolução sexual e cultural dos anos 60, cujo epicentro era justamente nos livrar da carolice e dos disciplinamentos mentais produzidos pela religião, parecemos ter dado marcha-a-ré.

 

Outro traço é o vitimismo. Ninguém descreveu melhor essa realidade do que Bradley Campbell e Jason Manning em seu The Rise of the Victimhood Culture. Eles identificam no mundo atual uma passagem da “cultura da dignidade” para a “cultura da vitimização”, cuja tônica é a extrema sensibilidade a qualquer coisa que possa ser tomada como ofensiva, em regra a partir de critérios altamente subjetivos, e com a tendência de sempre recorrer à autoridade (do Estado, da universidade, da empresa) para disciplinar a linguagem e punir os pecadores.

 

Por óbvio, há uma brutal seletividade na definição de quem tem direito a reclamar, que grupos merecem ou não o “respeito”. Mas isso é outra história.

*Veja

Sábado, 07 de janeiro 2023 às 21:11