Levantamento
de VEJA revela que o volume de bens e serviços exportados para Cuba não
condizem com os valores destinados para a obra
Desde
a inauguração, em janeiro de 2014, do Porto de Mariel, em Cuba, o BNDES (Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) é questionado quanto aos
critérios técnicos para o empréstimo de 682 milhões de dólares para a obra
(cujo custo total foi de quase 1 bilhão de dólares), que ficou a cargo da
empreiteira Odebrecht. A operação, feita com dinheiro dos contribuintes
brasileiros, era vantajosa para o banco? Qual era o benefício econômico da obra
para os interesses brasileiros? Por que o governo classificou o conteúdo do
contrato como "secreto", com validade até 2027? O BNDES e a Odebrecht
sempre deram a mesma resposta: que 100% do dinheiro investido não saiu do
Brasil, ficando aqui na forma de pagamento de salários, de custos de engenharia
e administração e de exportação de bens (cimento, aço, máquinas, carros, etc)
destinados à construção. Na semana passada, Luciano Coutinho, do BNDES, repetiu
a explicação em depoimento que marcou o início dos trabalhos da CPI (Comissão
Parlamentar de Inquérito), instalada na primeira semana de agosto no Congresso
para investigar possíveis irregularidades na atuação do banco.
Falando
não apenas de Mariel, Coutinho voltou a garantir que as operações de incentivo
a obras no exterior são rentáveis e que os 12 bilhões de dólares concedidos em
empréstimos foram integralmente destinados à compra de bens e à contratação de
serviços no Brasil. Esta, aliás, é a regra para que o dinheiro seja concedido.
Mas, como as obras são realizadas no exterior e não estão sujeitas ao
escrutínio do Tribunal de Contas da União, a forma como esse dinheiro é gasto é
uma caixa-preta que as empreiteiras e o próprio BNDES se recusam abrir.
Um
levantamento realizado por VEJA, a partir da análise da balança comercial
Brasil-Cuba, revela o abismo entre as explicações do presidente do BNDES e os
números oficiais disponíveis. O total da exportação de produtos brasileiros que
podem ser associados à construção civil (incluindo máquinas, caminhões,
tratores e peças de reposição) para Cuba, entre 2010 e 2013, corresponde a
apenas 22% do valor do empréstimo para construção do porto neste mesmo período.
Trata-se de uma estimativa otimista, pois é possível que parte desses produtos
exportados tenham sido destinados a outros empreendimentos, sem qualquer
relação com Mariel.
Por:
Leonardo Coutinho - VEJA
Domingo,
30 de agosto, 2015