O
Ministério Público Federal (MPF) pediu a prisão e ajuizou uma denúncia contra o
empresário inglês Anthony Jon Domingo Armstrong Emery, que presidiu o Alecrim
Futebol Clube, de Natal (RN) e o Monza, da Itália, e outros sete envolvidos em
um esquema de lavagem de dinheiro promovido no Rio Grande do Norte, entre os
anos de 2012 e 2014, que desviou pelo menos R$ 75 milhões de quase 2 mil
investidores. A ação penal é fruto da chamada Operação Godfather, deflagrada em
2014.
Através
do chamado Grupo Ecohouse, o empresário junto de sua enteada e principal sócia,
Gabriela Medeiros de Oliveira, prometia aos investidores ganhos de 20% por ano
com construção e venda de supostas casas do programa Minha Casa, Minha Vida, no
Rio Grande do Norte. Gabriela também foi alvo de pedido de prisão.
As
obras não eram concluídas ou sequer foram iniciadas, porque o grupo não possuía
convênio com o programa federal (embora divulgasse que era a única empresa
inglesa a deter tal privilégio). E o dinheiro dos investidores nunca foi devolvido.
A
ação penal de autoria do procurador da República Renan Paes Felix também
denunciou o funcionário da Caixa Econômica Federal, Jônatas Aragão Ramos, que
atestou ilegalmente e com base em informações mentirosas que a construtora de
Anthony Armstrong possuía contrato com o Minha Casa, Minha Vida. O banco
público esclareceu que não costuma emitir esse tipo de documentação e que o
funcionário não tinha o direito de fazê-lo.
Também
são alvos da denúncia cinco contadores que assinavam como “profissionais
independentes” as declarações (107 ao todo) que atestavam o suposto andamento
das obras: Aritelmo Franco da Silva, Alexandre Magno Mendes, André Pinheiro
Lopes, Jailson Silva de Araújo e Michel Ralan Bezerra Barros. Eles nunca
visitaram nem mesmo os canteiros. As declarações falsas ajudavam a ludibriar os
investidores.
O
pedido de prisão do inglês e de sua enteada brasileira chegou a ser feito no
curso da investigação, por parte da Polícia Federal. Porém a Justiça entendeu
na época que seriam suficientes a apreensão dos passaportes e a proibição de os
dois saírem do país. Mesmo assim a dupla fugiu do Brasil e, depois de passar
pelo Principado de Mônaco e pelos Emirados Árabes Unidos, se encontram em local
desconhecido. “Provavelmente usufruindo dos recursos que amealharam
criminosamente”, lamenta o MPF.
As
investigações da Operação Godfather iniciaram a partir de informações do
Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). E o nome da operação fez
alusão ao título em inglês do clássico da literatura e do cinema “O Poderoso
Chefão”, apelido de Anthony Armstrong no Rio Grande do Norte.
O
MPF detalha que o esquema prejudicou até 1.500 investidores de Singapura e
aproximadamente 350 do Reino Unido. Embora tenham passado pelas contas do Grupo
Ecohouse R$ 75 milhões nos dois anos e meio, há relatos de prejuízos ainda
maiores. Uma advogada que representa 400 clientes de Singapura calcula em R$ 64
milhões o prejuízo de seus representados.
Já
no Reino Unido, onde Armstrong foi condenado em março de 2019 pela Suprema
Corte Britânica, o prejuízo estimado no processo (em relação aos 350
investidores locais) foi de aproximadamente R$ 120 milhões. Naquele país, cada
interessado investia 23 mil libras esterlinas (uma libra vale hoje
aproximadamente R$ 6), enquanto em Singapura cada cota era vendida por 46 mil
dólares de Singapura (cada um está em aproximadamente R$ 3,5).
O
dinheiro era captado através da Ecohouse Brasil Construções (uma das empresas
do grupo e que atuava ilegalmente como instituição financeira) e desviado para
gastos pessoais dos dois principais envolvidos, além de investimentos em outras
empresas do grupo.
Ao
menos R$ 4 milhões foram gastos com o Alecrim Futebol Clube, do qual Armstrong
chegou a ser presidente; sem contar despesas com empresas particulares dos dois
líderes do esquema, como a QRV Segurança, o restaurante Liquid Lounge e a E H
Negócios Imobiliários. Esta última de fachada.
Gabriela
Medeiros e seu padrasto curtiam uma vida de luxo, viagens e compras, até como
forma de transmitir aos investidores a “saúde financeira” de seus negócios. Na
verdade, algumas poucas obras eram tocadas para servir de chamariz e, quando
investidores vinham visitá-las, um “rodízio de operários” era promovido para
dar a impressão de que estavam a pleno vapor.
No
caso do Alecrim, os valores empregados não foram registrados na contabilidade
do clube, que ao final o empresário abandonou, deixando como legado uma série
de ações trabalhistas e uma mancha na reputação do time.
Cerca
de R$ 1 milhão também foi gasto na promoção da Copa Ecohouse, que reuniu 16
clubes em 2013, incluindo alguns dos maiores do Nordeste e até o Fluminense
(RJ). Todo esse investimento visava à divulgação da imagem de Armstrong como um
grande empresário, somando-se ao arsenal de mentiras contadas aos investidores.
Os
dois líderes do grupo poderão responder por cinco tipos de crimes contra o
Sistema Financeiro Nacional: por divulgar informações falsas aos investidores;
utilizar de má-fé (como no uso de documentos falsos); apropriar-se do dinheiro
alheio em proveito próprio; induzir os investidores a erro; e operar
instituição financeira sem a devida autorização.
Eles
também foram denunciados por lavagem de dinheiro. E, junto de Jônatas Aragão,
por associação criminosa.
Já
o funcionário da Caixa e os cinco contadores podem responder por falsidade
ideológica.
Confira
aqui a íntegra da ação, que irá tramitar na
Justiça Federal sob o número 0801651-77.2020.4.05.8400.
(Com
informações da Ascom do MPF no Rio Grande do Norte)
Quinta-feira,
12 de março, 2020 ás 18:00